S, Ob, Cl. Sib, Fag, Cor, Pno, Quart. Cordas
Esta peça teve como ponto de partida a obra «A cidade e as serras» de Eça de Queirós. Este livro foi escrito depois de um conto preparatório intitulado «A civilização», de onde retirei o nome para a minhapeça.
Detive-me especialmente nas passagens em que o humor, nas suas várias formas (pitoresco, jocoso, irónico, etc.), assume o papel principal. De entre as muitas retive particularmente as descrições da ida à ópera: esta é vista como um acontecimento social, um pretexto para se mostrarem as melhores roupas, acessórios e maquilhagem (o famoso pó de arroz). A soprano solista assume o seu papel de atracção – deve ter um porte imponente de diva – e emocionar o público com as suas capacidades dramáticas.
Outra situação amplamente descrita por Eça de Queirós diz respeito às «engenhocas» próprias da civilização urbana do séc. XIX, aparelhos por vezes de utilidade duvidosa que se podiam tornar um pesadelo se mal manuseados ou avariados. Se utilizados exaustivamente tinham também a desvantagem de tornar bastante entediante o quotidiano.
Na minha peça faço alusão a vários destes quadros. A obra começa com uma abertura «solene», numa noite de Ópera – com os naturais reflexos a nível social – a que se segue um primeiro quadro, de expressão elegante e algo fútil, em ritmo ternário. De seguida o ambiente descomprometido do início altera-se, sentindo-se no ar pequenas conspirações, entretanto interrompidas, porque o espectáculo vai começar. Como a soprano demora a aparecer, essa interrupção é prolongada e desenvolvida durante algum tempo. Com a entrada da cantora, dá-se início a uma nova fase, com um primeiro momento expressivo e um segundo momento algo melodramático, excessivo, em que a voz insiste repetidamente em motivos agudos – qual mecanismo avariado – forçando a intervenção dos instrumentistas. A obra termina abruptamente, com um suspiro de alívio por parte dos músicos.
Fátima Fonte – 2007
Obra vencedora do 1º Prémio da Categoria 'Música de Câmara' do 2º Concurso Internacional de Composição da Póvoa de Varzim. Estreada em 21 de Julho de 2007, no Auditório Municipal da Póvoa de Varzim, pela soprano Raquel Camarinha e Camerata Senza Misura, em concerto integrado na 29ª edição do Festival Internacional de Música da Póvoa de Varzim.